Atlético: raiz, nutella e respeito ao próximo

Alisson Millo*

Quando criança, sempre ouvi do meu pai histórias sobre o boicote sofrido pelo Atlético ao longo dos anos 1980, principalmente contra o Flamengo. Essa história provavelmente você já viu e ouviu um milhão de vezes também. A teoria dele, fora o fato de o Flamengo ser o queridinho da mídia nacional, era uma espécie de censura principalmente ao centroavante Reinaldo e sua simbólica comemoração em homenagem aos Panteras Negras. Um time de massa que tinha em seu craque uma pessoa política e socialmente engajada não devia ser muito bem visto à época.


O motivo dessa breve aulinha de história pessoal é para tratar de um assunto triste que aconteceu no clássico do último domingo. Na falta de futebol, porque foi um 0 a 0 de doer as vistas, a polêmica tomou a mídia. Passada uma semana, você já deve ter visto o famigerado vídeo do cântico entoado por parte da torcida alvinegra e, caso não tenha se indignado, cabe uma reflexão sobre alguns conceitos.

Torcida dominou a pauta pós-clássico
(Créditos: Pedro Souza/Atlético-MG)

Quando Alexandre Kalil lançou a camisa rosa, em 2010, a polêmica tomou conta. Uma simples cor causou um alvoroço que dividiu a própria torcida e se tornou motivo de zoação do rival. Simplesmente por ser rosa. Como se uma cor, seja ela qual for, dissesse alguma coisa sobre a personalidade de alguém, de um clube, de uma instituição.

De mau gosto a piadas infundadas

Até hoje, um ponto de 'provocação' de alguns cruzeirenses é o ex-volante Richarlyson. Jogador limitado tecnicamente, é verdade, muito útil taticamente e com a raça que falta em muitas peças do atual elenco, mas questionado e motivo de piadas pelo excesso de curiosidade sobre o extracampo. Mais recentemente, o Cruzeiro fez uma apresentação de balé no lançamento de seu uniforme e, novamente, uma simples apresentação artística virou combustível para zoações infundadas e de mau gosto.

Atlético empatou com rival por 0 a 0
(Créditos: Bruno Cantini/Atlético-MG)

Querer tripudiar de uma questão muito séria da sociedade não é provocação. Estádio de futebol não é um espaço alheio ao mundo. Enquanto um grupo 'brinca' que A ou B - e aqui não cabe distinção política nem ideológica - vai matar outra pessoa pelo time que ela torce, um homossexual é realmente morto apenas por ser homossexual. Atleticano ser morto por cruzeirense apenas por torcer pelo Galo é inaceitável. Cruzeirense ser morto por atleticano só por torcer pelo rival é absurdo. Uma torcida inteira ser morta por supostamente ter outra opção sexual não é engraçado.

Racismo, homofobia e indignação

Da mesma forma que a indignação em casos de racismo é geral, com homofobia também deveria ser. Quando o Grêmio foi punido por torcedores terem chamado o goleiro Aranha de 'macaco', a decisão foi aprovada de forma unânime. Caso o Atlético seja punido por esse episódio lamentável de domingo, justiça seja feita, será merecido também. Se por isso o futebol virou nutella, talvez o raiz não fosse tão bom assim.

Galo perdeu boas chances no dérbi
(Créditos: Bruno Cantini/Atlético-MG)

Enquanto o mundo evolui, o futebol parece regredir. Em todos os âmbitos. A qualidade técnica piora a cada campeonato. Jogadores já com idade avançada são os destaques do Brasileirão porque os mais novos são limitados ou sem compromisso. Trazendo para a realidade do Atlético, você já deve ter associado alguns nomes a cada um desses adjetivos. As federações são, em sua maioria, patéticas. E a mentalidade de algumas pessoas parece ter ficado presa em um tempo em que corrupção não era investigada, evolução social e ideológica era inimaginável e desqualificar goleiro adversário simplesmente por usar um uniforme colorido era cabível.

A técnica do futebol não é a mesma. Velocidade e tática muito menos. Passou da hora de a cabeça acompanhar. Disputa só em campo.

*Jornalista. Corneteiro confesso e atleticano desde 1994.
@amillo01 no Twitter, capitão da seção Fala, Atleticano!

7 comentários:

  1. Perfeito. Sou uma das que acha que há exageros no politicamente correto, mas não podemos deixar de separar os exageros inofensivos de atitudes lamentáveis de racismo e homofobia, mesmo dentro dos estádios, onde provocações fazem parte da festa. A punição é necessária para deixar claro quando ultrapassam os limites do aceitável.

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  2. Eu não concordo com o fato de se punir o clube de futebol pelos atos de sua torcida! O clube nada tem a ver com a ignorância e a burrice de um cidadão ou de vários! Ele não tem o poder de vetar a entrada daquela pessoa em um evento ao qual ele pagou para entrar! A sociedade está doente, e o clube de futebol, assim como o artista em um teatro não tem culpa de quem pagou e entrou para assistir sua apresentação! Ambos já pagaram a polícia para garantir a segurança e até segurança privada! O seu papel foi cumprido, agora cabe aos homens da lei, identificar os infratores e puni-los, não exatamente ao clube!

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  3. Perfeito seus comentários. Futebol tá ficando chato!!!

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  4. Futebol ta é muito chato, nos anos 80/90 torcida chamava jogador de Via..e jogador imitava mascote, mandava torcida adversaria ficar calada qdo fazia gol, enfim...Dadá..Renato gaucho..Viola...Romário..Reinaldo e etc todos não teriam espaço hoje. Muito Nutella, saudades do tropeiro com ovo e muito torresmo e do vinho em copo de plastico da geral.

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  5. pior foi ter empatado com os amigos do manoel

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