Profissionais ligados ao pais asiático revelam metas e aspectos
do dia a dia do 'novo eldorado' da bola ao Blog Toque Di Letra
Vinícius Dias
Concluída na madrugada de 13 de
janeiro, a transação que tirou Ricardo Goulart do Cruzeiro representou a maior venda da história do clube. Na mesma semana, Diego Tardelli deixou o
Atlético, movimentando números milionários. 11 meses mais tarde, na reabertura
da janela, Mano Menezes não resistiu à oferta tentadora e acertou a saída,
deixando R$ 7 milhões nos cofres celestes. Os três tiveram um mesmo destino: a
China, 'novo eldorado' da bola. Um contexto em que investimentos, sonhos, futebol
e política caminham quase lado a lado.
LEIA MAIS: 'A estrutura é muito boa', afirma Goulart
Conforme avalia o advogado
desportivo Luciano Brustolini, a ascensão do esporte passa pela aspiração do
líder comunista Xi Jinping, que preside a China há dois anos. "Ele é um
entusiasta do futebol e tem como projeto pessoal desenvolvimento dos clubes
chineses e fortalecimento do futebol local". Em um cenário dominado pelos
clubes-empresa, o governo marca presença também como investidor. "O
(Shandong) Luneng, (clube) bem conhecido no Brasil, é financiado pela maior
empresa estatal de energia elétrica da China", exemplifica.
Tardelli: estrela do Shandong Luneng (Créditos: Shandong Luneng/Divulgação) |
Ao mesmo tempo em que
potencializa o aspecto econômico, contudo, a participação dessas empresas torna
a estrutura mais frágil. "Apesar dos crescentes investimentos, os clubes
chineses ainda não são sólidos. Não são clubes centenários, que possuem
história", diz Brustolini. "A saída de uma dessas empresas pode
significar a falência de um clube, como quase ocorreu com o Shangai Shenhua,
que contratou Anelka, Drogba, e depois teve sérios problemas financeiros",
completa.
Chineses de olho no Brasil
Com status de referência, o Brasil é um dos maiores fornecedores de
mão de obra especializada. Conforme levantamento feito pelo portal Rede do Futebol, 41 brasileiros atuaram
na China na temporada passada. Atletas como Robinho, Ricardo Goulart e Diego Tardelli dividem os gramados com compatriotas menos badalados, como Eleílson
Farias, zagueiro do Jiangsu Sainty, e Everton Ramos, atacante do Nanchang Bayi.
Ainda há técnicos, fisioterapeutas e preparadores físicos na lista.
Paulo Henrique, ex-Atlético, na China (Créditos: Shangai Greenland/Divulgação) |
Para o atacante Paulo Henrique,
que defendeu o Liaoning Whowin neste semestre, a legião brasileira tem papel
decisivo na China. "O futebol arte vem do Brasil... Portanto, para o
futebol chinês crescer, era necessária a presença de jogadores e treinadores
brasileiros", afirma. O jogador, que desembarcou no país em junho de 2014,
diz que o aspecto financeiro foi vital para a escolha. "Com o investimento
que vem sendo feito, o futebol chinês ainda vai crescer mais nos próximos anos
e até mesmo refletir na seleção deles", acrescenta o ex-atleticano.
Dificuldades de adaptação
Com passagens por Holanda,
Bélgica e Turquia, o brasileiro pontua que, inicialmente, as diferenças
culturais dificultaram a adaptação. "Na China, é tudo diferente: cultura,
culinária, idioma". Paulo conta com o apoio de um tradutor para facilitar
a comunicação com os atletas locais, por exemplo. Mas minimiza. "Já passei
por situações difíceis desde que saí do Brasil (do Atlético), com 18 anos. Faz
parte da nossa profissão e temos que estar preparados". Em campo, a
adaptação foi imediata: em 32 jogos no país, o atacante registra 15 gols.
Felipão: atual treinador do Evergrande (Créditos: Guangzhou Evergrande/Divulgação) |
Craque da Superliga Chinesa, o
ex-cruzeirense Ricardo Goulart aponta a velocidade como diferencial das
partidas disputadas no país asiático. "Eles correm muito", compara. O
camisa 11 do Guangzhou Evergrande avalia o calendário local como mais bem
organizado do que o brasileiro. "Temos menos jogos e um pouco mais de
tempo de folga". Com passagem pelo rival local Guangzhou R&F, o
fisiologista Matheus Henrique Fontes também elogia os moldes chineses.
Treinamentos de alto nível
"Na China, os clubes têm
próximo de 60 dias de pré-temporada e jogam uma vez por semana, normalmente.
Sendo assim, é possível pensar em treinamentos", afirma, revelando as
diferenças de preparação. "No Brasil, temos 30 dias de pré-temporada e em
grande parte do ano joga-se duas vezes por semana, restando aos profissionais
apenas tempo para pensar em recuperação do atleta e pequenos ajustes. Então, é
preciso fazer uma escolha: treinar em alta intensidade ou competir nas melhores
condições físicas", assinala o fisiologista.
Matheus Fontes ao lado de Mourinho (Créditos: Arquivo Pessoal/Matheus Fontes) |
Na visão de Luciano Brustolini,
o principal objetivo dos chineses é ter uma liga com clubes e marcas fortes.
"Pelo número de habitantes, a China é o maior potencial de consumo de
futebol, ou qualquer outro produto, no mundo. E por que não consumir o próprio
futebol, ao invés das marcas estrangeiras?", questiona. Ainda assim, em
curto prazo, ele não crê em competição com a Europa em termos de visibilidade.
"Os grandes clubes europeus são as grandes marcas do futebol, têm
história, apelo, e isso somente pode ser combatido com o tempo", pondera.
Sediar e conquistar a Copa
Matheus Fontes, que trabalhou em
Cantão, uma das principais cidades do dragão asiático, acrescenta. "O
governo chinês está investindo milhões de dólares, alguns relatos dizem até
bilhões, no futebol. Está incentivando a modalidade nas escolas e pretende desenvolver
centros de aprendizagem como a Alemanha fez. O intuito do governo chinês é
sediar uma Copa do Mundo e ser campeão mundial em casa".
Anselmo Ramon defende o Greentown (Créditos: Hangzhou Greentown/Divulgação) |
As
cifras bilionárias aparecem também nas cotas de TV. Em outubro, a China Sports
Media assegurou a compra dos direitos de transmissão do campeonato local pelas
próximas cinco temporadas, investindo US$ 1,26 bilhão - cerca R$ 1 bilhão por
temporada. O montante supera em mais de 3.000% os valores do contrato anterior.
Intercâmbio nos gramados
Para associar o poderio
econômico à proposta de capacitação dos atletas chineses, a federação fixa
limites à presença de estrangeiros. De acordo com o agente internacional Steve
Panopoulos, cada clube pode inscrever cinco estrangeiros - incluindo um atleta
de país asiático. Por jogo, podem atuar quatro - desde que um seja asiático. Os
goleiros de todos os times têm de ser locais. As regras asseguram o intercâmbio
e a presença de, no mínimo, 14 chineses em campo por jogo.
Reportagem fantástica!! Parabéns!
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